Leitura Terminada
Como já aqui referi em ocasiões anteriores, adorei o anterior livro de Luize Valente, “Uma Praça em Antuérpia”. Achei esta autora muito especial, pela forma de escrever, de nos envolver nas histórias e de nos “ensinar” sobre momentos históricos como se estivesse a falar da coisa mais banal do mundo, ainda que os momentos sejam críticos.
Este livro, nesse aspecto, foi igualmente excepcional!
Eu não quero escrever aqui um resumo muito alargado sobre a história, porque facilmente uma pessoa dá por si a contar a história toda, com imensos spoilers.
Digamos apenas que, mais uma vez, saltamos embalados entre o passado e o presente e somos constantemente surpreendidos com o enredo, as personagens, os acontecimentos.
Amália sabe que tem na família um passado do qual os pais se quiseram afastar. Ao interceptar uma chamada entre o pai e a bisavó, com a qual ele não tem contacto há dezenas de anos, fica demasiado curiosa e vai tentar encontrar que passado é esse de que os pais se envergonham. Consegue encontrar a bisavó, que lhe conta algumas partes da história, em particular que o seu avô, Friedrich Schmidt, inicialmente introduzido na Juventude Hitleriana e piloto da Luftwaffe, após um acidente de avião deixa de poder pilotar e são-lhe assignadas outras funções pelo Reich, nomeadamente ir a Auschwitz investigar denúncias sobre desvios de dinheiros e bens do Reich (sacados aos judeus assim que lá chegavam). Ao chegar a Auschwitz tem um rebate de consciência e humanidade ao testemunhar o que lá acontecia e percebemos que salva uma recém-nascida judia, Haya, para quem compõe uma sonata (tinha formação musical) e que desaparece ao tentar salvá-la.
Mas a bisavó não lhe conta toda a história e, entretanto, dá o último sopro, pelo que Amália decide tentar encontrar Haya para saber qual foi a sua história, qual o envolvimento do seu avô com ela e o que terá afinal sucedido com ele. Terá realmente morrido? Será que ainda está vivo? Será o seu avô pai dessa bebé judia?
E é aqui que entramos nesta viagem entre o passado e o presente, onde se misturam terrivelmente bem factos históricos com ficção, onde se dilui a história da família de Haya naquilo que foi uma das maiores vergonhas do século XX.
É um facto que no núcleo desta história está o cenário da II Guerra Mundial, com um foco particular no movimento anti-semita na Alemanha, Hungria e noutras partes do Mundo e, como se depreende pelo título, nos “campos de trabalho”, nomeadamente Auschwitz. Já todos sabemos sobre o assunto, aprendemos nas aulas de história, lemos sobre isso, vimos documentários, quem nunca viu “A Lista de Schindler”?
Só que esta autora tem a capacidade fantástica de nos fazer sentir na pele o que milhares de judeus terão sentido naquela altura, quando se viram capturados e enviados nem sabiam para onde. Essas partes não são fáceis de ler, como podem compreender, em particular as partes sobre as chaminés e o céu permanentemente carregado de cinzas, mas até mesmo as condições desumanas em que viviam até chegar a sua vez de irem para a câmara de gás.
Não é demasiado chocante no sentido de ser algo completamente novo (são factos históricos que já sabemos), mas é muito tocante, porque nos tornamos muito próximos das personagens e só lhes queremos deitar a mão e tirá-los daqueles vagões e daquele lugar onde se ia para morrer.
“Quem salva uma vida salva o mundo inteiro”…
No meio disto, vamos continuamente sendo surpreendidos por pormenores da história da família de Haya e sobre o que realmente aconteceu com o avô de Amália.
Tive pena de no final não acompanharmos como foi para Amália lidar dali para a frente tendo conhecimento do seu passado. Era bom que tivesse havido um confronto entre Amália e os pais, para que tudo se clarificasse e ficassem todos em paz.
Apesar disso é um livro fabuloso, ao qual dei 5 estrelas no Goodreads, porque não é fácil ler sobre este tema do Holocausto e acho que só mesmo Luize Valente para me fazer ler um livro sobre este assunto de uma forma ávida.
Por muito que ainda não consiga compreender como foi que este Holocausto aconteceu, como foi que existiram pessoas tão loucas no Mundo…e como continuamos a estar entregues a outros loucos por este Mundo fora e sempre na expectativa do que pode vir por aí…
Muito obrigada à Saída de Emergência por me terem feito chegar um exemplar deste maravilhoso livro. Espero que venham a publicar futuros livros da Luize Valente que é, sem dúvida, uma autora a conhecer e a seguir!