Leitura Terminada
Há livros que nos divertem. Há livros que nos empolgam. Há livros que engrenam o nosso cérebro. Há livros que nos metem medo. Há livros que nos apaixonam.
E depois há livros assim, que nos deixam maravilhados e muito comovidos.
Este livro é pequeno, tem umas 200 páginas, e tem pouco texto, capítulos curtos e muita área vazia em muitas páginas. Mas é tão, tão profundo.
Nesta história o jovem Jan, de dez anos, começa a perceber mudanças familiares quando os avós Joan e Caterina deixam a sua pequena aldeia e se mudam para a sua casa em Barcelona. Jan tem uma relação muito especial com os pais e com os avós. Mas a relação mais forte de todas é aquela que tem com o seu avô Joan. E o seu avó está diferente. E a mãe e a avó cochicham. E ele sente que há qualquer coisa estranha e má que vem por aí. E se, por um lado quer saber, por outro lado não quer ter as respostas. Porque quando chegarem as respostas as coisas não vão ser iguais.
O avô de Jan começa a perder a memória. E Jan sofre com isso. Sofre com as mudanças que isso provoca na sua família, mas sofre especialmente quando percebe que o avó vai deixar de ser como é. E se pode esquecer dele. E de si próprio, aliás.
O que fica de um indivíduo quando se perde a memória? Quando olha para os outros e não os reconhece? Quando não sabe onde está? Quando olha ao espelho e não se reconhece…
Todo o percurso de vida de uma pessoa é feito de memórias, de recordações. E ficam especialmente aqueles momentos que definem a vida, que definem a pessoa. Por vezes, as recordações de coisas simples são as mais importantes. E quando perdemos as recordações, o que fica? Antes de as perdermos, urge passá-las a alguém que as guarde e as torne suas.
A escrita de Tina Vallès é tão bonita, o livro está tão bem escrito, as dúvidas e os sentimentos de Jan estão tão maravilhosamente descritos, que é por isso que li este livro praticamente do início ao fim com um nó na garganta e que me fartei de chorar em muitos momentos. Porque me senti na pele de Jan, porque tive momentos na vida em que pensei o mesmo, senti o mesmo, tive os mesmos medos. E porque senti muita, muita saudade…
Os avós são um pilar tão importante na vida de uma criança…e é tão duro quando ganhamos consciência de que já não são jovens, que estão a definhar, que estão doentes, que os vamos perder...Bah!
É um livro que se lê muito rapidamente, lê-se em poucas horas. Mas que nos marca tanto! Adorei!
Ficou na minha mesa de cabeceira. Sei que lhe vou pegar mais vezes e reler. Porque às vezes precisamos mesmo de ler um livro assim, de ler um livro que nos comova a sério, que mexa connosco, que nos faça sentir muito, muito pequeninos…
É maravilhoso. Obviamente que lhe dei as 5 estrelas no Goodreads.
Recomendo!!
"Não percebi lá muito bem, mas o olhos do meu pai diziam-me que ele não queria mais perguntas e eu já estava bem assim.
Há respostas que vêm sozinhas, mais tarde, talvez em fila, como uma migalha de pão nas costas de uma formiga, ou pelo ar, como o canto de uma cigarra."
...
"Eu gostava de ser surdo, mas acho que mesmo assim o ouviria, porque há palavras que se dizem com o corpo e são os corpos dos outros que as ouvem, não têm a ver com bocas e ouvidos."