Sim, eu vi a Super Nanny e vou comentar sobre isso
Porque não ver e comentar seria parvo, certo?
Eu tenho uma certa aversão a este tipo de programa dos canais genéricos. Quase nunca vejo nada porque raramente me identifico e tenho coisas mais úteis para fazer.
Só fui ver quando percebi: 1º que havia um programa com este nome e este conteúdo 2º porque me apercebi das polémicas em torno do mesmo.
O primeiro comentário que me surgiu com este programa foi com o próprio nome. Onde é que aquilo é uma Super Nanny, ou uma Nanny de todo?
Nanny em inglês significa ama. Ama é uma pessoa que cuida de uma criança na ausência dos pais, sendo que os pais normalmente deixam a criança entregue aos seus cuidados na casa da ama. Se for na própria casa onde a criança reside, existem as babysitters para tomar conta da criança na ausência dos pais.
Só por isso, fiquei logo um bocado de comichão.
Então, em suma, o primeiro episódio focava-se numa criança de 7 anos, deliciosamente rotulada como “Furacão Margarida” (mais pontos a favor, isto parece o thriller de um filme) com comportamentos inadequados (birras, bater na mãe, recusa em dormir na sua cama, etc…) e uma grande falta de autonomia em coisas um bocado básicas para a sua idade (não se vestia sozinha, não tomava banho sozinha (obviamente que uma criança desta idade deve ser vigiada, mas deve já saber ensaboar-se e passar o corpo por água), não lavava os dentes sozinha, não comia sozinha, etc…).
Naturalmente que as crianças desenvolvem todas a diferentes ritmos, mas há coisas que já seria esperado que uma criança em idade escolar fizesse (porque quando está na escola, tem de comer sozinha, ir ao WC sozinha).
E também é natural que os pais, por vezes, não saibam lidar correctamente ou de todo com o comportamento dos filhos (escusam de vir já as Super Mães, que sabem tudo e têm crianças lindas e sempre limpas e bem comportadas, que isso pode ser verdade numa percentagem bem pequena de casos, mas todos sabemos que na maioria dos casos é muita garganta, mas vai-se a ver e não é). Quantas vezes não me passei da marmita, não dei uma palmada, não mandei um berro, não me senti a não saber como lidar com uma certa situação, não chorei por sentir que estava a perder o controlo? Muitas vezes desde logo porque se estiver cansada tenho menos paciência (ah e tal, uma Super Mãe nunca está cansada! Parabéns, eu não sou uma Super Mãe) para as fitas, os revirar de olhos, as respostas tortas, as teimosias e por aí fora. E já tive momentos em que senti que havia problemas para lá da minha capacidade e recorri a ajuda profissional.
Não gostei da exposição tão clara de uma criança, em especial em momentos de suposta intimidade familiar e de vulnerabilidade. É demasiado show off, mas infelizmente são estas porcarias que conseguem audiências, é “demasiado bom” ver os outros a fazer figuras tristes. Acho que o programa a funcionar neste formato tinha de ter a cara da criança desfocada, para dizer o mínimo. Ainda que, eles tenham mostrado a casa das pessoas por fora e a localidade onde residiam, e identificando de forma clara a mãe e a avó, quem as conheça identifica a criança. Mas ao menos, para quem não as conheça, a criança ficava resguardada.
Depois, há coisas que não são claras. A criança era filha de pais separados, mas não se percebe se tem algum contacto com o pai, em que moldes e qual o tipo de relação.
E esta questão teria sido importante para perceber certos comportamentos da criança, que em certa medida me pareceram ter a ver com raiva, confusão, chantagem emocional com a mãe por causa do pai.
Muitos pais se calhar identificaram-se com o programa e acharam útil na medida do aproveitamento das dicas dadas pela “Super Nanny” para lidar com os problemas.
Não questiono muito as dicas que foram dadas: a criação de limites é essencial para que as crianças saibam onde e como se enquadrar e, mais, para perceberem que gostamos deles, a definição de regras, o reforço positivo, a recompensa, não me choca. Há muitas técnicas para o fazer, mas desde que resulte e se traduza em a criança se sentir amada, apreciada, auto-confiante e que consiga ganhar mais autonomia é tudo bom.
Mas havia muitas formas de ter um programa com dicas para os pais de crianças “problemáticas” e esta não gostei.
O excesso de exposição da criança, a “Supper Nanny” a avaliar presencialmente as situações e a dar conselhos em frente à criança, mostrando à criança as fraquezas da mãe (podia ter visionado vídeos e falar com a mãe posteriormente), enfim, não gostei de nada daquilo.
Eu diria que os pais que aceitaram participar neste programa provavelmente receberam dinheiro para isso e isso ajuda muito com a resolução dos problemas. É melhor a SIC pagar-me qualquer coisa e eu expor o meu filho na televisão do que ter eu de pagar consultas com um psicólogo ou psiquiatra.
A “Super Nanny” é na verdade uma psicóloga que, como não pode ir para um programa de TV no seu papel de psicóloga (porque está proibida pela Ordem), se põe numa atitude meio arrogante e de distanciamento e, quando as criticas começaram a chover, pôs-se logo na atitude do “isso é problema da SIC, eu só vim cá receber o meu, não estou cá como psicóloga”. Se não está como psicóloga então não faz falta! Sinceramente, não é uma pessoa à qual recorresse enquanto psicóloga se tivesse necessidade, depois de ter visto o que vi.
Não gostei da forma com ela falou com a mãe e com a criança. Demasiado professoral, quando muito daquilo é senso comum. Muito distanciamento em relação à criança. Uma atitude pouco profissional de colocar a mão na testa num “oh meu Deus, nem acredito no que estou a ver” assim um bocado snob. Um bom psicólogo, mais do que bichanar aos pais o que fazer, tem de criar uma ligação com a criança, para conseguir entrar dentro da sua cabeça, perceber os seus problemas e ajudar a resolver os problemas de fundo. Resolvendo esses, o resto vai. Mas é preciso tempo.
Por isso, acho que o fórum para resolução deste tipo de problemas não é num programa televisivo com este formato. É abrir os cordões à bolsa e pedir ajuda profissional como deve ser.
Até porque chegamos ao fim e a sensação que fica é que houve ali uma ligeira melhoria e depois voltou um bocado ao mesmo.
Não estou certa de que tenha ajudado realmente a criança e a mãe/avó. Além de que a criança agora se deve fartar de ser gozada na escola, o que vai ajudar ainda mais a aumentar os problemas.
E, pessoas, a sério que compararam este programa com o do César Milan? A sério, que encontraram semelhanças? Nem vou comentar isto…